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Tempo de Saudades

Abril de 2020.
Vivemos em tempos como nunca antes havíamos pensado ter ou sequer existir nas nossas vidas.
É muito para além daquilo que poderíamos imaginar porque a verdade é que quando olhamos as noticias, pouco depois passamos ao lado e esquecemos. Tão simples assim.

Começou a ouvir-se falar num vírus, algures pela China. Ouvia-se o telejornal e nada indicava que viesse ter connosco...até porque "essas coisas" são desses países longes...Pois. Só que não.
A 19 de março de 2020 e depois de já anteriormente ter sido recomendado ficar em casa, o mais resguardado possível, foi decretado estado de emergência no nosso Portugal.
Nunca antes visto...e tudo alterou. Consciencializar as pessoas para estar fechadas em casa, obrigar a fechar espaços de ajuntamento social, condicionar todos os hábitos que adquirimos nos nossos dias em prol duma prevenção extremamente necessária.

Hoje é dia 8 de abril e continuamos confinados às nossas casas. Tirando aqueles que existe a necessidade de trabalharem por exigência da profissão, a larga maioria de nós está fechada.
E tudo muda...
Já sou de pensar bastante e analisar..agora mais ainda parece-me. Embora tente não o fazer em demasia para não pifar da marmita, mais ainda.

Mas muito muda...
Pensamos em manter tempo de qualidade e não de quantidade,
Pensamos em quem realmente nos faz falta falar e acabamos por falar todos os dias,
Pensamos nos abraços que até por vezes nos irritavam mas que tanta falta nos fazem agora,
Pensamos nas rotinas para as quais bufávamos e não tínhamos paciência e que agora matávamos por elas,
Pensamos nas saudades de sorrisos,
...nas saudades da presença do outro, nas saudades do carinho, do mimo, da proximidade, do toque...

Vivemos tempos de saudade, daquilo que no dia a dia parecia tão banal tão adquirido...sem termos a noção de nada.

Sair de casa simplesmente e entrar no carro e seguir viagem...Não, hoje sais de casa e levas o mini frasco de desinfetante, abres as portas até chegares à saída com luvas ou desinfetas as mãos logo a seguir, e assim sucessivamente.
Vais ao supermercado e levas sacos teus, o que até então era desperdício de sacos e sacos em algumas pessoas, tentas levar lista de compras para ser o mais preciso e rápido possível, quase que rezas para não encontrares ninguém conhecido e que nem se aproximem de ti. Nos corredores as pessoas tentam não se cruzar, uns de luvas e máscaras, outros sem nada...mas cada um a transportar o seu medo.

Quem está com a família dentro de 4 paredes, não sei se torna a situação mais leve...uns dizem que sim outros que não... dias e dias inteiros como tudo tem os seus prós e contras.
Agora para quem está sozinho não é fácil.
E só posso falar de mim...
Tenho saudades da mãe chata que também está sozinha. 
Tenho saudades dos amigos e de conviver livremente.
Saudades de abracinhos bons, de beijos repenicados e muitas gargalhadas próximas.
Saudades do aconchego e do mimo presencial que cada pessoa tem em mim.
Saudades de conduzir deliberadamente para aqui ou para ali.
Saudades de baton e salto alto, de ginásio e transpiração, de copos e ar fresco pela madrugada.
Saudades carregadas todos os dias em conjunto com o medo. O querer que tudo passe rápido...e tudo volte ao normal...Mas nada será mais o "normal".

Mas estas saudades também servem para perceber quem sente o mesmo para connosco, quem sente a nossa falta realmente, quem nos consegue tratar bem e não esquecer nestes tempos de isolamento...

Quem nos consegue mimar à distância de um clic vale tudo neste momento e valerá mais ainda no depois...porque  não...não vamos ficar todos bem...não vai ficar tudo bem...muito vai mudar...e só nos iremos aperceber disso quando sairmos deste confinamento...aí irá doer novamente, mas de outras formas. 
Acredito, infelizmente.


A.Pinheiro
08/04/2020

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